terça-feira, 2 de março de 2010

O coveiro da Bola

O árbitro é um sujeito largado à própria sorte. Toda vez que piso em um estádio de futebol, sempre me vem uma simples pergunta à mente. Afinal, por que cargas d’água o sujeito resolve ser juiz de futebol? Seria pelo gosto gostoso de exercer o poder? Seria pelo fato de ali, naqueles 90 minutos, ele poder deixar o anonimato para trás e ganhar os holofotes? Ou seria por que naquela hora e meia ele poderia expurgar seus medos, seus erros do cotidiano simplório presente na vida de cada de um de nós? Haveria ainda alguma inclinação prazerosa em ser ovacionado negativamente pela massa presente?




Difícil encontrar resposta plausível, porque nunca vi um juiz sair de campo aplaudido. Toda vez que há uma boa arbitragem, o aplauso ao árbitro se materializa no desprezo. Ninguém o repara, o elogia, nada. Nem um afago, um simples gesto. Agora, basta um único erro, desses corriqueiros, para que a torcida, os jogadores, o técnico o classifiquem com os piores adjetivos possíveis e muitas vezes questionem até sua idoneidade.



É bem verdade que o juiz ajuda a criar esse universo negativo imaginário a seu respeito. Já de cara seu uniforme destoa do restante do espetáculo. Ao trajar, via de regra, preto, o árbitro sinaliza à massa que a catástrofe se faz presente ali. Seu caminhar pelo gramado à espera do erro, do equívoco, da má performance, aliado ao simbolismo da cor, transforma o personagem na verdadeira ave de agouro, no coveiro da bola. Em suma, é o próprio Senhor Morte em campo.




Além da natural profissionalização, que se faz cada vez mais necessária, penso que o árbitro de futebol deveria aposentar de vez esse uniforme preto. Roupas alegres que não descaracterizem a austeridade da função, bom treinamento e uma ajuda eletrônica dariam uma boa mão a essa profissão, que já é difícil a valer. Além de custosa na decolagem e cruel na aterrissagem.




Sim, porque no mundo da bola do marketing esportivo não há como esperar mais pela profissionalização. E pela adoção dos recursos eletrônicos! É muita crueldade alijar o juiz de futebol da tecnologia que revolucionou o planeta. A tecnologia colocaria um ponto final nessa solidão que o acompanha desde sempre, mesmo que o “amigo” em questão seja o virtual. Nessa, não vale o ditado de “antes só do que mal acompanhado”. Nessa, não! Até porque o mundo virtual consegue absorver bem essa choradeira, muitas vezes inflada por não conseguirem admitir que simplesmente não jogaram bem àquela peleja, que perambula pelo mundo da bola.




Por Maurício Capela